Querido diário – Com carinho, Carolina

     LaduPort, 20 de janeiro de …

     Querido diário,

     Como de costume precisamos ter mais uma daquelas conversas que, na minha opinião, ninguém ainda está pronto para ter…

     Recentemente, tive um desentendimento a bordo com um de meus colegas de trabalho. O motivo? Então, era tão importante que não lembro mais o porquê de termos discutido. O que me lembro, sem dúvidas, era de estar com razão diante da situação vivida (ou pelo menos era no que eu acreditava). Ficamos alguns dias sem nos falar direito. Comunicávamos apenas o essencial e, sendo sincero, poderíamos estar assim até hoje se não fosse, provavelmente, pela vida que levávamos.

     Não éramos melhores amigos nem nada, entretanto, com o passar dos dias, estando dentro de um navio, você entende que sempre há formas de tornar sua rotina mais leve, assim como há também inúmeras outras possibilidades de torná-la mais desgastante. A princípio, possa parecer um pensamento trivial, porém, quero que tenha em mente que, ao mencionar “rotina desgastante”, não estou mais falando daquele cenário infantil no qual nos desentendemos com uma pessoa e a deixamos de querer bem. Falo de um cenário pautado no desinteresse, o qual é capaz de gerar uma indiferença essencialmente cansativa.

     Como disse anteriormente, poderíamos estar sem nos falar direito até hoje. Todavia, estar a bordo também nos traz uma realidade consideravelmente distinta da vivência em terra. Refiro-me a uma experiência que não dá margens para fugas, ou seja, não é como se fôssemos nos atirar em meio ao oceano simplesmente porque precisamos dar um “tempo” de tudo. Não é assim que funciona na conjuntura de bordo. Aqui dentro, já se trata da vida madura, a qual tenho noção de, não necessariamente, coincidir com a vida adulta.

     Foi justamente nessa linha de raciocínio, que comecei a entender cada vez mais o conceito do verbo ceder. Acredito, sim, que, em uma desavença, nem tudo pode ser relevado e a compreensão de ambas as partes se faz necessária para que os interesses se alinhem, porém, também creio que, com o devido tempo, tudo pode ser repensado.  Aprendi então, talvez não da melhor forma, a ceder. E cedi. Cedi, por vezes, acreditando estar com razão e cedi igualmente mesmo quando não a tinha, quando a posse, neste caso, costumava ter do orgulho.

     Admitir erros é uma tarefa assombrosa. Nem todos são capazes de realizá-la e muitos vão morrer acreditando que estavam fazendo a coisa certa. Arrependo-me de muitas coisas e, às vezes, é só com o arrependimento que nos damos conta do calibre da atitude que tomamos. A verdade é que as pessoas, ou melhor, nós somos dotados de sentimentos. Sentimentos os quais podem gerar atitudes ou falas precipitadas e é um tanto quanto árduo reconhecer tudo isso.

     Sendo assim, certo dia, ao me perguntarem o que havia acontecido e eu não ter sabido responder, resolvi fazer diferente. Sabia que existia a possibilidade de ser melhor. Nossa relação (minha e de meu colega de trabalho) não precisava ser daquela forma repleta de indiferença. Poderia ser mais leve, menos desgastante. Quando me peguei pensando nisso, foi igualmente quando parei para refletir o motivo de nossa discussão. Já havia esquecido. E então pensei mais uma vez, será que vale mesmo a pena me submeter a toda essa relação enrijecida? Ou será que talvez não fosse apenas uma questão de ambos elevarmos um pouco a nossa tolerância?

     Até daqui a outra conversa precoce,

     A.

TEXTO – Al. Carolina Moura

REVISÃO – Al. Juliana Vieira

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