Prato do dia – Com carinho, Carolina

     Hoje, o cardápio previsto era porco. Não é lá uma das minhas refeições favoritas, mas deveria prepará-la, pois toda a tripulação ansiava pela hora do almoço.

     Não estava me sentindo bem… O balanço do navio mareava meu estômago de forma que me sentia em uma montanha-russa girando interminavelmente. O cheiro daquela carne, a qual descongelava sobre o tabuleiro, somado ao sangue que escorria, à medida que ela ia derretendo, estavam criando um cenário nem um pouco favorável à minha situação. Entretanto, precisava aquecer o óleo e criar forças para fritá-la. Sinceramente, não queria e, se pudesse, não o faria.

     O arroz já estava quase no ponto certo, assim como o feijão. Resolvi preparar uma farofa na tentativa de ganhar certo tempo até ter de enfrentar aquela proteína. Ao passo que a cebola ia dourando juntamente com a manteiga que, por sua vez, ia se desfazendo, a cozinha, como um todo, foi tomada por um cheiro formidável! Não fosse pela minha condição de estômago embrulhado, teria me maravilhado por aquela sensação.

     A farofa ficou pronta, mas o tempo não foi suficiente para que eu ficasse (pronto) também. Todavia, acendi o fogo e deixei o óleo esquentar. Comecei a fritar e precisava me apressar, pois o horário do almoço se aproximava.

     Confesso que já havia antes preparado outras refeições em condições similares e o que mais me confortava era saber que, dentro de algumas horas, todo aquele mal-estar passaria. Sei que é difícil ter essa mentalidade durante o momento propriamente dito, mas, naquela hora, procurei me lembrar de outras vezes em que havia fritado peixe, por exemplo, e que aquilo não teria durado para sempre…

      Creio que seja sobre isso. Sobre, diante de uma situação angustiante, ser capaz de lembrar e de acreditar que tal angústia não sobreviverá invicta ao tempo, por mais eterna que possa parecer. A princípio, depositar toda essa confiança no decorrer dos minutos, ou quem sabe dias, meses e até mesmo anos, talvez soe arriscado e ineficaz, contudo, vão existir situações em que não haverá escolhas. São aquelas horas nas quais não se tem alguém para quem ligar, alguém com quem contar, alguém em quem confiar. De repente, a simples imaginação acaba se tornando nossa melhor opção. O vislumbre de um cenário distinto e a lembrança de que um dia já fora diferente podem ser nossos únicos e confiáveis aliados.

     Ter ido uma única vez a determinado local provavelmente não seja o suficiente para retornarmos a ele por conta própria, entretanto, sem dúvidas, somos capazes de imaginar como é estar lá. Somos capazes de acessar até as mais distantes lembranças que nos marcaram. E é disso que trato. Falo sobre estarmos aptos a acessar serenas memórias diante de turbulentas realidades…

     Talvez hoje, não tenha lá sido o dia do meu prato, mas pude garantir que o prato do dia estivesse pronto.  A farofa, o arroz, o feijão e a carne de porco foram servidos e, para janta, teríamos lasanha.

TEXTO – Al. Carolina Moura

 

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