Dona Ana – Com carinho, Carolina

     GuijoaPort, 20 de junho de 2023.

     Dona Ana,   

     Cheguei! Dona Ana, cheguei! Estava com saudade. Mal posso esperar para tomar aquele famoso suco de kiwi o qual, na minha opinião, é um dos melhores! Como é bom estar de volta! Como é bom estar em terra firme! Sinto uma sensação que infelizmente não consigo verbalizar, uma sensação pertencente exclusivamente aos tão destemidos homens do mar e que só fui capaz de entender quando me tornei um deles.

     Independente de quantos embarques já tenha realizado, sempre me encanto ao retornar para cá. Por mais que já esteja exausto no fim da jornada, não posso negar que sobra sempre uma parte do meu organismo dedicada a se empolgar com o momento do regresso, afinal, é ele um forte candidato capaz de tornar nossas despedidas menos dolorosas.

     Lembro-me até hoje da primeira vez que parti, da primeira vez que embarquei… Logo em meu dia inicial, o único pensamento que tinha era o de querer estar o mais longe possível daquele navio. Nunca havia sentido um mal estar tão intenso em toda minha vivência. Estava deveras mareado. Pensei infinitas vezes em ir embora, em me despedir do navio, entretanto, sabia que, caso optasse por desembarcar, certamente me arrependeria.

     Também me lembro da noite deste mesmo dia, a pior por sinal. Saí do meu quarto e fui ao passadiço a procura de qualquer membro da tripulação que pudesse me tirar dali. Navegávamos ao longo da costa brasileira. Estava tudo escuro, todos equipamentos estavam operando em modo noturno e eu não enxergava praticamente nada. Não sei ao certo como, mas, no instante em que cheguei ao passadiço, alguém que parecia ter me identificado me perguntou se estava tudo bem. Ao ouvir o som da voz familiar, já escutada no almoço daquela manhã, sabia de quem se tratava. Imediatamente o chamei para conversar e ele me conduziu em direção à popa do navio.

     Aquele tripulante decerto não tinha nenhuma cura milagrosa para fazer meu organismo se sentir melhor, todavia, tinha palavras. Belas palavras. As quais possivelmente não iriam me impedir de me sentir mareado, mas poderiam me impedir de abandonar aquele navio. Às vezes, acho que precisamos de alguém que nos conforte na hora certa. Alguém capaz de impedir antecipadas despedidas. E foi exatamente o que ele fez. Não sei o motivo de ter me ajudado, uma vez que não nos conhecíamos, mas era como se compartilhássemos de algo em comum. Contou-me que caberia a mim ficar ou ir embora, mas que teria seu apoio independentemente do que optasse.

     Não vou ser hipócrita e dizer que falo sobre isso com orgulho. Claro que não. Tenho muita vergonha para ser sincero. Este é o tipo de coisa que talvez só compartilharia com a minha mãe se ainda estivesse viva. Tristemente não está. Nos despedimos ao longo da minha formação. Foram dias difíceis, mas a tenho guardada na memória com muito carinho.

     Esta foi uma despedida de uma viagem sem regresso.

     Espero que possamos nos encontrar em breve.

     G.

TEXTO – Al. Carolina Moura

REVISÃO – Al. Juliana Vieira

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